terça-feira, 18 de agosto de 2009

Os Fundamentos do Budismo

Desde há muito, o problema da origem, significado e finalidade da existência tem inquietado o pensamento metafisico do homem histórico.Os caminhos do pensamento especulativo podem ser identificados como três: os das religiões, os da filosofia e modernamente os da ciência. A maior parte das perspectivas religiosas perfazem um circulo vicioso: começam e terminam por um dogma, geralmente inexplicável, inquestionável. Os rumos da filosofia, como têm sido analisados por Martin Heidegger, têm seguido os “caminhos que não levam a nenhum lugar”, desde Platão e Aristóteles, o que Heidegger chama de “errância do Ser”. Os problemas da ciência tem-se transformados em problemas não mais de Ciência, mas de tecnologia, com finalidades práticas e cegas. A ciência faz, mas não sabe por que faz.

A resposta a esta questão nobre não tem conseguido progressos porque:

1) a filosofia elabora teorias sobre teorias,
2) a ciencia se preocupa com o mundo dos fenômenos, onde “ser é parecer” e
3) as religiões são fundadas numa lei cega: o mito.

O Budismo, que não é filosofia, religião ou ciência, mas um modo de existência, acredita que a questão tem de ser questionada no campo da psicologia, na interioridade da mente.
A psicologia alcançou excelentes graus de desenvolvimento, na sua ansiosa busca pela felicidade do homem, mas os grandes problemas, tais como o da morte, permanecem intocados.

Francis Story salienta a novidade da psicologia em relação ao Ocidente, e diz que, se examinarmos as correntes de pensamento, de seis séculos antes de Cristo, em voga na Índia ao tempo de Buddha, acharemos lá todas as sementes das modernas e antigas teorias ocidentais, de Plotino a Kierkegaard, e que o próprio Buddha descreveu no Brahmajala Sutta do Digha Nikaya, sendo o Sublime, antes da Iluminação, um estudioso de todas as teorias e de todos os filósofos de sua época, como Alara Kalama e Udaka Ramaputta, importantes iogues de alto poder de absorção mental, homens de elevadissima sabedoria, mas que foram abandonados por Sidarta Gotama que então prosseguiu sozinho.

Uma meditação do princípe Sidarta anuncia a concepção da vida que terá depois: Um dia, enquanto seu pai estava ocupado com a cerimônia do ritual da primavera, o jovem príncipe observava pequeninos e delicados pássaros que disputavam os vermes e insetos que apareciam numa charrete. O príncipe espantou-se, a principio, de como aqueles pássaros, considerados pelos homens como simbolos da realização espiritual, cujo canto está ao nível do dos poetas, como aqueles pássaros pudessem ser crueis e mesquinhos para outras espécies de animais menores, assim como os maiores e perigosos animais. Assim, ainda na infância, o jovem príncipe viu que os pássaros são obrigados a comer para viver, e para tal são obrigados a disputar o alimento com os outros. Assim é a natureza; nesta generalização está uma lei universal. Pois não somente a natureza é indiferente ao sofrimento e a crueldade, mas e ela mesma que impõe estas condições a todos os seres vivos se eles querem subsistir. Magoar ou padecer, ou fazer magoar e padecer tal é a lei da vida. Assim, podemos dizer, que o jovem descobriu a inexistência de um Deus misericordioso, regendo o universo.

Mas os fundamentos do budismo, - as Quatro Nobre Verdades - diz Francis Story, que dão a chave do problema da vida, só podem ser realmente compreendidos, se vistos, face a face, num alto grau de jhana. Depois de seis anos árduos de austeridade inútil e de sofrimento, o Buddha pôde dizer: “Eu descobri esta verdade profunda, difícil de perceber, difícil de compreender, tranquilizante e sublime, que não pode ser decifrada pela razão e que e visível apenas para o sábio”. Esta verdade é desdobrada nas Quatro Nobres Verdades que são fundamentos do budismo e resumem tudo o que se-lhe segue: “A verdade do sofrimento (ou dukkha), a verdade da causa do sofrimento (ou de dukkha), a ver dade da cessação do sofrimento e a verdade do caminho Óctuplo que conduz à cessação do sofrimento (ou de dukkha).

A filosofia contemporânea ocidental abriga concepções da primeira nobre verdade, a verdade do sofrimento. A partir de Nietsche, que proclamou a morte de Deus, o pensamento ocidental existencialista desenvolve-se num nihilismo e pessimismo angustiantes, porque representam a primeira verdade sem a existência das 3 demais, que apontam um caminho, uma saída, uma salvação. Mesmo as doutrinas marxistas, que se vangloriam de serem afirmativas e progressistas, esbarram nos problemas humanos, limitando-se aos sociais.

O desenvolvimento da análise da Primeira Nobre Verdade conduz a uma explicação física do mundo como materialidade. Pois a matéria, de que e constituida a forma e natureza de todas as coisas, pode ser definida como energia, isto é, algo que se pode descrever como agitação incessante e sem repouso; Em outra palavra, como dukkha. A Segunda Nobre Verdade, a verdade da causa do sofrimento, está explicada por uma lei de causa e efeito chamada Kamma, ou carma. Buddha definia-o: “Isto tendo sido, aquilo vem a ser”. Define-se, também, com isso, a inexistência de um eu substancial, ou alma, pois o processo do vir a ser está em completa mutação. O carma é uma explicação da origem da vida no universo, e da própria existência deste universo. Mas o Buddha não recomendava investigações como estas, que não conduzem ao fim do sofrimento, mas dizia que “Nem Deus nem Brama podem ser os criadores da roda do Samsara; Um fenômeno vazio segue seu curso sujeito à causa e as condições”.

O problema das formações carmicas engendram um processo de energia e vir-a-ser energético. Mesmo o pensamento, e seus movimentos, são energia que promovem um vir-a-ser individual constante. Eis por que é tão importante o procedimento de meditaçao de atenção, porque nos faz conscientes e portanto senhores de nosso porvir, pelo autoconhecimento e auto-observação.

O budismo oferece este meio de erradicar os males da existência, e de perturbar esse processo de vir-a-ser constante, a que até mesmo os deuses estão sujeitos. A esses respeito, algo novo pode nascer das descobertas da neurologia, que percebeu que o cérebro irradia ondas de energia dita elétrica.

Todo ato volitivo é irradiado, como ondas de rádio, e pode ser essa irradiação um dia concebida como a causadora das relações de causa e efeito, teleologicamente. A vida não é a criação de um Deus Criador consciente, que tivesse seu objetivo plenamente em vista, mas o resultado de uma força cega, transmitida de um ser vivo a outro. A Nobre Verdade da Cessação do Sofrimento trata da Iluminação.

A Iluminação de Buddha se fez em tres etapas. Na 1ª parte da noite ele tomou conhecimento da existência do que existiu antes, antes dos estados de existência. Na 2ª parte da noite ele adquiriu o conhecimento de como os seres passam de um estado de existência a outro. Neste ponto, ele percebeu a Lei do Sofrimento, ou dukkha, e a Lei da Causa do Sofrimento, a 1ª e 2ª Nobre Verdades. Enfim, na última parte da noite, ele penetrou no conhecimento das causas sub-jacentes da existência, o processo das origens explicadoras da existência.

No Dhammapada, v. 153-154, declara solenemente o Buddha:
“Na última vigília da noite, cheio de compaixão pelos seres vivos, fixando meu espírito nas origens interdependentes e meditando acerca da ordem do dever e da sua cessação, ao sol nascente eu alcancei a iluminação suprema.” Nirvana significa a cessação do processo de vir-a-ser. É a paz, a tranquilidade, a absoluta realização. Não é nem aniquilação, nem não-aniquilação, mas um estado em que não pode haver impermanência. É o estado Incondicionado. Buddha recusou-se a dar uma definição positiva do Nirvana, talvez porque estes estados são indefiniveis, assim como as grandezas do Universo.

A Quarta Nobre Verdade, ou o Óctuplo Caminho, engloba compreensão correta, intenção correta, palavra correta, ação correta, meio de vida correto, esforço correto, atenção correta e concentração correta.

Esta é uma filosofia de vida. A análise desse Caminho Óctuplo merece uma reunião a parte e minuciosa. A doutrina do Buddha pode ser considerada a mais extensa e penetrante explicação e orientação do homem sobre a terra.


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