segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Der Himmel ünder Berlin, 1987

"Na gélida e devastada Berlim do pós-guerra, um batalhão de anjos, entre eles os anjos Damiel e Cassiel, vela pelas almas perdidas que sofrem e se desesperam em silêncio.
Eles assistem às desventuras terrenas, mas não podem sentir as dores e alegrias humanas. Damiel não escapa incólume de sua condição divina, ao se apaixonar pela trapezista Marion e não poder consumar seu desejo. Para poder tocá-la, ele deve deixar de ser anjo e tornar-se humano, perdendo sua condição imortal. Para guiá-lo em sua escolha, surge um anjo caído que soube fazer a transição entre os dois mundos.
É um filme franco-alemão ocidental de 1987, do gênero drama fantástico, escrito, produzido e dirigido por Wim Wenders. Narra a disputa entre o divino e o efêmero, uma reflexão de Wim Wenders sobre a existência humana. Com uma lentidão cercada de imagens em cor e preto-e-branco, focalizando o olhar de anjos e homens, Wenders construiu um dos filmes mais poéticos da década de 1980. No final do filme há a participação de Nick Cave acompanhado de sua banda The Bad Seeds, quando ocorre o encontro do anjo caído e sua amada, ao som da canção From Here to Eternity."





A análise deste filme são conjecturas. Trata-se de hipóteses imaginativas da autora deste texto, baseada em estudos de análises semióticas, podendo ser convalidada ou invalidada, pois a terceiridade alcança por qualquer autor de uma obra, é inatingível.
O filme se passa em uma Alemanha pós Segunda Guerra Mundial. Em meio a tanta destruição, um anjo, Daniel, se apaixona por uma trapezista de um circo, e abdica de sua imortalidade para poder senti-la e tocá-la.
Wim Wenders inicia seu filme com o anjo que escreve uma carta. Nela, ele diz, em outras palavras, que a criança deseja que o riacho seja rio, que o rio seja torrente e que a poça d´água seja o mar. Ou seja, a criança quer que o pequeno seja o grande, se deslocando do seu lugar, “pequeno”, para a imensidão. Ele faz essa alusão para mostrar que a imaginação da criança não tem fronteira, se opondo à limitação do adulto e se igualando a do anjo.
Há uma forte analogia da mente dos anjos com a das crianças, que se une através da fantasia e falta de noção de fronteira que ambos possuem. Isto é apresentado por sinais como: só a criança consegue ver os anjos, o pensamento da criança é semelhante a dos anjos, ambos possuem a mesma ingenuidade.
Logo após, aparece à imagem de um céu com nuvens seguido de um olho e a cidade de Berlim vista de cima. Esta cena se refere ao olhar que conduz ao mundo sensorial, ou seja, o olhar faz uma conexão entre os anjos e os seres humanos, entre o céu e a terra.
Uma crítica é feita quando aparece uma criança de costas para a janela e esta fala que não há nada para se ver na televisão. Analogicamente, pode-se concluir que ela renega a realidade para viver o fictício mundo sensorial da televisão, mesmo que este não apresente nada interessantes para o desenvolvimento do homem.
Indagações da vida do ser humano, como “quem sou” eu, “de onde venho” e “para onde vamos”, é muito presente nos filmes de Wim Wenders, em Asas do Desejo, ele coloca as indagações como surgindo da mente das crianças, apesar de que estas perguntas surgem perante o medo, o temor da morte e fracasso.
Os anjos vêem o mundo em preto e branco por não têm a caleidoscopia do mundo sensorial. Eles são capazes de captar o conteúdo dos pensamentos dos seres humanos e quebrar barreiras de espaço, podem ir a qualquer local sem restrição, porém são incapazes de sentir, tocar, ser visto ou ouvido por alguém que não seja anjo.
Daniel quer abdicar das certezas do mundo para poder supor ao invés de saber, quer ser humano e poder sentir as coisas, ou seja, quer sair da terceiridade para viver a primeiridade, como uma criança vive. Pode-se verificar que apesar de predominar nos anjos a terceiridade, Daniel passa por um conflito e um momento de secundidade.
Percebe-se no filme a presença de diferentes patamares, seja na biblioteca, seja no ônibus de dois andares, seja no set de filmagem. Essa diferença pode-se atribuir aos diferentes níveis da imaginação e compreensão da mente, extratos de vida que pode existir.
A idéia do imaginário se contrapõe ao real, os dois níveis de patamares são contrapostos, no qual um é mais baixo que o outro. A duplicidade em níveis mais profundos e outros mais superficiais são todos interligados por uma “escada”: o beliche tem uma escada para subir ou descer para um outro nível, assim como os dois andares de um ônibus, os dois patamares do set de filmagem, por exemplo.
A primeira vez que Daniel vê a trapezista Marion, ela está no circo, em cima do trapézio, vestida de anjo. Há uma ambigüidade, pois, até então, o anjo olhava tudo de cima para baixo e dessa vez, ele está embaixo e ela em cima, o que mostra que ele está sobre o domínio dela.
Uma frase muito interessante nesta passagem é que o treinador diz para Marion não balançar e sim voar, mas ela responde com a seguinte frase: “não consigo voar com estas asas”. Ou seja, a asa, analogicamente representado como algo bom, que dará possibilidade para ela ir além, não traz benefício e sim a impossibilita de movimentar-se e ser livre, como o anjo Daniel se sente.
Ao sair do circo, Daniel segue Marion e um dos circenses diz que está vendo um anjo passar, se referindo à asa da trapezista. Daniel acha que um homem conseguiu vê-lo e se sente feliz pelo fato de poder ser percebido e visto por alguém que não é anjo.
A necessidade de poder sentir, cheirar e conseguir ver as cores de objetos e pessoas é o principal conflito do personagem principal. Ele quer se tornar humano para poder segurar e dimensionar as coisas, porém Cassiel, um anjo completamente racional que prevalece nele a terceiridade, mostra a destruição, as ruínas e as atrocidades que os homens causam. Alerta seu amigo implicitamente, com as ruínas pós segunda Guerra Mundial, que o mundo do homem é um mundo de cães, onde um mata o outro para sobreviver e tirar vantagens.
Inversamente ao anjo, um homem decide se matar, pois quer livrar-se de todas as indagações e questionamentos, ele não quer mais ter duvidas e sim soluções e respostas para seus conflitos. Ele se mata em busca da imortalidade, enquanto o anjo quer se tornar ser humano para não ter mais respostas de tudo.
O anjo Cassiel ajuda seu amigo a pular do outro lado do muro para tornar-se ser humano. Ao fazer a transição de uma realidade para outra, uma armadura caí em cima de sua cabeça. Essa armadura por ser dourada, representa dinheiro, ao mesmo tempo em que representa proteção.
Daniel passa a ver as cores, sente frio e dor. O sangue vermelho que escorre da sua cabeça representa a vida. As pessoas passam a vê-lo e ele aprende a identificar as cores. Vive intensamente cada momento único dessa sua nova fase.
Apesar de todas as dificuldades, Daniel percebe que melhor que poder olhar de cima, é poder olhar nos olhos, sentir, ver e ser visto. O sensorial tem um poder muito forte neste filme.
Cada ato que o ex-anjo faz, descreve a sensação que ele tem. Quando toma café, por exemplo, saboreia-o e sente prazer em cada gole que dá desta bebida.
O discurso que ele fazia com frases como “quando a criança era a criança ela fazia determinada coisa e hoje ela não faz mais”, quando ele se torna humano, ele muda seu discurso, fala que o que a criança fazia ainda o faz, porque por mais que as pessoas cresçam a essência da infância ainda continua em cada uma delas.
Mas ele só conseguiu perceber isso quando deixou de ser saber todos os caminhos e passou a sentir a vida, pois ele passou a ter uma parte “criança”, que canta, brinca, ri etc. O adulto tem consciência dos seus atos, mas não deixa em momento algum, agir com sentimento, seja ele qual for.
Daniel vai onde o circo estava instalado e não encontra Marion, nesse momento, nós, telespectadores nos indagamos se vale à pena abdicar de tudo para ficar com uma mulher que idealizamos, sem termos a certeza se conseguiremos aquilo desejado.
Mas depois percebemos que independente dele ficar com ela, valeu a pena, pois ele conseguiu atingir a primeiridade jamais possível como sendo anjo.
Quando Daniel encontra com Marion pela primeira vez, o diretor mostra como se os dois já tivessem se conhecido antes, ele quer mostrar que eles já se conheciam, porém apenas na fantasia.
A surpresa é que faz do anjo, um ser humano. O significado desta frase dita no final do filme retoma a idéia de que o anjo, por conhecer o destino de todos os seres humanos, não consegue se surpreender de nada. Diferentemente do homem, que por ter incerteza de tudo na vida, pode se surpreender com qualquer coisa e é isso que acontece com o anjo Daniel ao se humanizar. A comunicação é extra-sensorial. O pensamento do anjo é colocado em contraposição com a comunicação através dos sentidos, feita pelos seres-humanos.
Uma última observação a ser feita é que após tornar-se ser humano, as barreiras inexistentes tornam-se existentes e aparentes, um exemplo disso é quando o “ex-anjo” fala com o ator de um filme e é barrado pelos seguranças e depois por uma cerca.
Mostra assim que as barreiras criadas pelo ser humano podem distanciar fisicamente as pessoas, porém jamais o distanciará psicologicamente.



por Ingrid Lambrecht


Pais: Alemanha/Frana/Turquia
Ano: 1987
Tempo: 127 min
Direção: Win Wenders
Arquivo: 492.82 MB
Formato: rmvb
legendado / P/b
Link Download: WingsOfDesire
Video: Cena


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