sábado, 8 de agosto de 2009

Existiu mesmo um cinema Expressionista? - Parte I

O filme fantástico na véspera das vanguardas cinematográficas

O cinema expressionista é identificado diretamente com a República de Weimar, instalada na Alemanha após a derrota do país na Primeira Guerra Mundial, em 1918. No entanto, também esteve ligado à indústria cinematográfica nacional que havia florescido antes da Guerra, sob o comando do Kaiser Guilherme II.

Na aurora do cinema, a Alemanha não estava atrás de outros países desenvolvidos (como França e EUA) na busca por uma tecnologia de reprodução fotográfica do movimento. Tanto que, em outubro de 1895, os irmãos Skladanovsky criaram, em Berlim, o Bioscópio, aparelho muito semelhante ao Cinematógrafo que os irmãos Lumière exibiriam em dezembro do mesmo ano, em Paris, dando origem ao que ficaria conhecido como "a sétima arte".

Ao longo da década seguinte, o cinema foi-se tornando cada vez mais importante para a indústria do entretenimento. Primeiramente, formou-se um circuito de exibição em locais fixos, criados com objetivos comerciais, com uma programação voltada a filmes curtos, exibidos em seqüência. A partir de 1905-1907, teve início um processo de sofisticação das salas, de introdução de longas-metragens e de reestruturação do espaço social vinculado ao cinema. Nesse sentido, o cinema na Alemanha se organizou de maneira semelhante ao do resto do mundo desenvolvido no começo do século XX. No entanto, em seus primeiros 20 anos de existência, o cinema alemão teve um desenvolvimento industrial mais lento que o de seus vizinhos. Até 1910/11, por exemplo, o país produzia apenas 10% dos filmes exibidos nos seus cinemas, importando a maior parte da programação da França, da Itália, da Dinamarca e dos EUA.

Mas, mesmo com uma indústria pouco eficiente, foram realizadas inúmeras fitas de diferentes orçamentos e gêneros na Alemanha antes da Primeira Guerra Mundial. O que prejudica o conhecimento mais aprofundado do assunto é a falta de material investigativo, pois muito se perdeu durante o conflito. Além disso, os principais estudos sobre o período mudo alemão consideraram o cinema do Segundo Império "arcaico" e sem importância, cujo único interesse estaria reduzido aos filmes que, de alguma maneira, influenciaram os filmes de Weimar.

Mas, ultimamente, diversos autores têm tentado resgatar esse cinema sem ter em vista o extraordinário desenvolvimento estético e industrial do pós-Guerra. Seus estudos apontam para temas interessantes. No livro de Thomas Elsaesser intitulado Weimar Cinema and After: Germany's Historical Imaginary (1996), é possível encontrar informações curiosas. O pesquisador belga Martin Loiperdinder, por exemplo, revela que o Kaiser Guilherme II foi o primeiro grande "astro" do cinema alemão, participando não apenas de documentários sobre a família real, mas também de filmes de propaganda e até mesmo de operetas.

Heide Schlüpmann também faz uma curiosa observação dos filmes do período ao comentar que muitos deles apresentavam uma certa feminilidade que seria ignorada pelos filmes da república de Weimar, centrados em figuras masculinas. A autora destaca o fato de as mulheres já formarem grande parte do público do cinema alemão desde os primeiros anos do século 20, provavelmente em função dos muitos melodramas dirigidos a elas, entre os quais A Traidora (Die Verräterin, 1911), de Urban Gad, em que uma moça mimada pelo pai dá a vida para salvar seu amado tenente; e Madeleine (1912), de Emil Albes, em que outra amante se sacrifica por um soldado durante a guerra franco-prussiana. Esse destaque dado às mulheres também se refletiu no incipiente star-system do cinema germânico, que tinha à frente uma mulher: a atriz dinamarquesa Asta Nielsen, trazida ao país pelo influente produtor Paul Davidson em 1911. Entre as várias atrizes de destaque no período, há também que lembrar Ossi Oswalda e Póla Negri, que protagonizaram comédias e dramas históricos de Ernest Lubitch, o primeiro diretor alemão a ser importado por Hollywood, em 1922.

Outro tema importante acerca do cinema alemão anterior à Primeira Guerra é a influência do cinema escandinavo. Além da presença da Nordisk (companhia dinamarquesa instalada na Alemanha), muitos profissionais foram importados do extremo norte da Europa, tais como os atores Asta Nielsen e Olaf Fonss; os diretores Urban Gad e Stellan Rye; e também o famoso cinegrafista Axel Graatkajoer. A influência do cinema nórdico também se fez sentir no trabalho de fotografia marcado pelo uso da paisagem realista como elemento dramático e poético – lição fundamental para a constituição do cinema expressionista.


Foto: Das Cabinet des Dr. Caligari (1920)

O fantástico e a vanguarda


O primeiro passo do cinema alemão em direção às vanguardas artísticas deu-se em 1912, quando o produtor Paul Davidson assinou um contrato com o sindicato dos dramaturgos, criando o chamado "filme de autor" (Autorenfilm). A partir de então, grandes escritores passaram a adaptar suas obras e a escrever roteiros originais, atraindo diretores e atores de prestígio do mundo teatral. Um dos artistas mais importantes nesse contexto foi o diretor Max Reinhardt, que levou consigo alguns dos atores que dirigia no Deutsche Theather – entre eles os célebres Conrad Veidt, Werner Krauss e Emil Jannings.

O primeiro "filme de autor" alemão foi também o primeiro drama psicanalítico do cinema, e já flertava com o fantástico: trata-se de O Outro (Der Andere, 1913) de Max Mack, com Albert Bassermann no papel de um homem que desenvolve dupla personalidade após um acidente. No mesmo ano, foi lançado O Estudante de Praga (Der Student Von Prag, 1913), o filme mais conhecido do período. Dirigido por Stellan Rye, contou com a colaboração de Paul Wegener (ator e produtor) e do roteirista Hans Heinz Ewers (escritor de contos de horror), ambos entusiastas das possibilidades da nova arte de servir aos temas fantásticos. O resultado foi uma obra seminal que se apropriava de textos como William Wilson, de Edgar Allan Poe; O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde; Aventuras de uma Noite de São Silvestre, de E.T.A Hoffmann e Fausto, de Goethe, para contar a história trágica do estudante Baldwin (Paul Wegener), perseguido por um duplo fantasmagórico após vender seu reflexo no espelho a um demônio.

Na linha "feminina" apontada por Heide Scülpman, alguns filmes que também sugeriam eventos fantásticos traziam figuras femininas importantes. É o caso da balada romântica Viver duas Vezes (Zweimal Gelebt, 1912), de Max Mack: sua história traz uma mulher desmemoriada que é raptada pelo médico e acaba morrendo ao reencontrar o verdadeiro marido. Um outro exemplo ainda mais significativo, A Esfera Negra/As irmãs Misteriosas (Die Schwartze Kugel/Die geheimnisvollen Schwester, 1913), de Franz Hofer, apresenta duas irmãs que investigam a morte de uma terceira, e descobrem que o culpado é um conde que vive numa casa misteriosa cheia de passagens secretas.

A temática fantástica seria retomada várias vezes, com destaque para um filme perdido baseado em uma lenda medieval judaica: O Golem (Der Golem), dirigido por Heinrick Galeen (1881-1949) e estrelado por Paul Wegener, em 1915. Nesse filme, um comerciante de antigüidades, ao ressuscitar o monstro de barro descoberto por operários nas ruínas de uma sinagoga, acaba provocando uma tragédia familiar.

Porém, a obra mais influente do período foi Homunculus (Die Rache des Homunculus), de Otto Rippert, uma série de seis filmes realizados entre 1916 e 1917, dos quais restaram apenas alguns fragmentos. Trata-se da história de um homem produzido em laboratório (Olaf Fonss) que, revoltado com sua condição não-humana, decide dominar o mundo. Segundo diversos teóricos que tiveram acesso aos trechos conservados, a série já apresentava elementos que seriam retomados pelo cinema expressionista, entre eles a ligação com o gótico, os efeitos dramáticos de sombra e luz e os vilões com poderes sobrenaturais.

O que é importante ressaltar sobre esse conjunto de filmes alemães é o fato de não terem sido importantes apenas pelo aspecto fantástico: eles estavam, de fato, na vanguarda da linguagem cinematográfica desenvolvida na Alemanha – menos complexa que a norte-americana, francesa, italiana ou dinamarquesa, mas nem por isso desprezível. Por outro lado, é preciso observar que a curiosidade pelo fantástico percebida nessas obras não deriva necessariamente de um impulso "tipicamente alemão", como muitos autores tentaram apontar: muitas vezes, a exploração da fantasia tinha relação com experiências ligadas à própria tecnologia das trucagens cinematográficas – o que também se deu em outros países.


Foto: Friedrich Wilhelm Murnau

O surgimento de uma indústria

Com a intensificação da Guerra a partir de 1916, o cinema alemão se distanciou temporariamente dos temas fantásticos, mas foi levado a criar as bases industriais que dariam sustentação às produções da República de Weimar, tantas vezes ligadas ao gênero. Afinal, com o país excluído do circuito de distribuição internacional de filmes, foi necessário que a indústria cinematográfica alemã suprisse sozinha o mercado interno, e ainda produzisse filmes de guerra para manter o moral da população.

Em 1917, com apoio de grandes grupos privados, o Estado alemão fundou a UFA (Universum Film AktienGesellschaft), companhia que passou a centralizar a maior parte da produção, distribuição e exibição de filmes no país, e que se transformou no maior truste cinematográfico da Europa. Com a Revolução de 1918, a UFA se transformou numa empresa de capital privado, e sua preocupação com a propaganda foi ofuscada pela consideração comercial.

Em 1921, o país reabriu as importações de filmes estrangeiros em 15%, retomando as relações com o cinema do resto do mundo. Isso beneficiou enormemente a UFA, que, até então, exportava filmes apenas para países "neutros", como Suíça e Holanda. Os primeiros grandes sucessos internacionais alemães foram as superproduções históricas do cineasta Ernest Lubitch: Madame du Barry (1918) e Anna Boleyn (1919). Mas, no mesmo ano, ao incorporar a produtora Decla Bioscop (de Erich Pommer) a UFA adquiriria aquele que foi seu maior êxito internacional do período mudo: o filme O Gabinete do Dr. Caligari, realizado para a Decla, por Robert Wiene, em 1919. Este, ao elevar o filme fantástico à categoria de arte, mudaria (literalmente) o cenário do cinema mundial.


... Continua parte II

Um comentário:

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