quinta-feira, 17 de setembro de 2009

1932

Quando Getúlio Vargas subiu ao poder, após o golpe de 1930, não respeitou a autonomia de São Paulo, nomeando um Interventor de fora, não conservando seu Presidente (nessa época os governadores eram denominados Presidentes).
Isso desgostou todos paulistas, sobretudo os dirigente do Partido Republicano Paulista (PRP) que não se conformavam com o fato de São Paulo estar sendo comandado por um estranho".
Foi desencadeada uma grande propaganda contra o governo federal, com os lemas:"São Paulo dominado por gente estranha!"; "São Paulo conquistado"; "Tudo pela Constituição" ou "Convocação imediata da Constituinte". O Interventor João Alberto pediu demissão. Getúlio nomeou então um paulista, o diplomata Pedro de Toledo, mas era tarde, os ânimos estavam exaltados. São Paulo tinha um Interventor paulista e civil, mas a situação não se acalmou.

No dia 25 de janeiro de 1932, aniversário da cidade de São Paulo, houve um imenso comício na Praça da Sé, colorido com bandeiras de São Paulo. Partidos políticos que eram rivais estavam unidos. O descontentamento foi aumentando e o povo se revoltou. Em 22 e 23 de maio, estudantes e populares queimaram e empastelaram as redações dos jornais ditatoriais e, nesse conflito, foram mortos quatro estudantes de Direito: Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo. O nome dos quatro serviu para no futuro designar o movimento paulista: MMDC. O primeiro a morrer foi Camargo, justamente o estudante que era casado e pai de três filhos.

A idéia de revolução tomou conta de todos, sem distinção de classe social. Ninguém podia ficar neutro: ou era a favor ou contra São Paulo! Não se admitia a neutralidade. Enfim, todos eram a favor.
São Paulo estava confiante da vitória, pois contava com o apoio dos militares de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Mato Grosso. Mas somente Mato Grosso manteve-se leal a SP. O comandante da Revolução era o general Isidoro Dias Lopes, apoiado fortemente pelo contingente de Mato Grosso, comandado pelo general Bertoldo Klinger.

Médicos, engenheiros, químicos, estudantes, operários, padres, freiras, colégios, comerciantes, empresas, associações, indústrias, donas-de-casa, formaram a solidariedade pública. Todos acorreram em massa ao chamado da Revolução. Era a mobilização de todos os recursos humanos e materiais.

Foram realizados verdadeiros prodígios de técnica, produzindo munição de infantaria, morteiros pesados e leves, granadas de mão e de fuzil, máscaras anti-gases, lança-chamas, etc. Foram blindados trens, automóveis, e montados canhões pesados sobre vias férreas.

No dia 9 de julho de 1932, o Interventor Pedro de Toledo telegrafava ao ditador Getúlio Vargas: "Esgotados os meios que ao meu alcance estiveram para evitar o movimento que acaba de se verificar na guarnição desta Região ao qual aderiu o povo paulista, não me foi possível caminhar ao revés dos sentimentos do meu povo". Começava a Revolução Constitucionalista.

Em 9 de julho eclodiu o movimento revolucionário, com os paulistas acreditando possuir o apoio de outros Estados, notadamente Minas Gerais, Rio Grande do Sul e do sul de Mato Grosso, para a derrubada de Getúlio Vargas.Pedro de Toledo, que ganhara forte apoio dos paulistas, foi proclamado governador de São Paulo e foi o comandante civil da revolução constituionalista. Foi lançado uma proclamação da "Junta Revolucionária" conclamando os paulistas a lutarem contra a ditadura. Formavam a Junta Revolucionária, Francisco Morato do Partido Democrático, Antônio de Pádua Sales do PRP, Generais Bertoldo Klinger e Isidoro Dias Lopes. O general Euclides Figueiredo assumiu a 2º Região Militar.

Alistaram-se 200.000 voluntários, sendo que estima-se que destes, 60.000 combaterem nas fileiras do Exército constitucionalista.

No Estado de São Paulo, a Revolução de 1932, contou com um grande contingente de voluntários civis e militares e o apoio de políticos de outros Estados, antigos apoiadores da Revolução de 1930, como, no Rio Grande do Sul, Raul Pilla, Borges de Medeiros, Batista Luzardo e João Neves da Fontoura entre outros, que formaram a Frente Única Rio Grandense, e que tentaram fazer uma revolta mas foram capturados, (salvo Batista Luzardo que conseguiu fugir), e exilados pelo interventor gaúcho.

No atual Mato Grosso do Sul foi formado um estado independente que se chamou Estado de Maracaju, que apoiou São Paulo. Em Minas Gerais, a revolução de 1932 obteve o apoio do ex presidente Artur Bernardes, que terminou também exilado.

São Paulo esperava a adesão do interventor do Rio Grande do Sul, o estado mais bem armado, mas este na última hora decidiu enviar tropas não para apoiar São Paulo, mas para combater os paulistas.

Quando se inicia o levante, uma multidão sai às ruas em apoio. Tropas paulistas são enviadas para os fronts em todo o Estado. Mas as tropas federais são mais numerosas e bem equipadas. Aviões são usados para bombardear cidades do interior paulista. 40 mil homens de São Paulo enfrentam um contingente de 100 mil soldados.Os planos paulistas previam um rápido e fulminante movimento em direção ao Rio de Janeiro pelo Vale do Paraíba, com a retaguarda assegurada pelo apoio que seria dado pelos outros estados.

Porém, sem o apoio dos outros estados o plano imaginado por São Paulo não se concretizou: Rio Grande do Sul e Minas Gerais foram compelidos por Vargas a se manterem ao seu lado e a publicidade de pretensão separatista do movimento levou São Paulo a se ver sozinho, com o apoio de apenas algumas tropas mato-grossenses, contra o restante do Brasil. Comandados por Pedro de Toledo, aclamado governador revolucionário, e pelo general Bertoldo Klinger, as tropas paulistas se viram lutando em três grandes frentes: o Vale do Paraíba, o Sul Paulista e Leste Paulista.

O estado de São Paulo, apesar de contar com mais de quarenta mil soldados, estava em desvantagem. Por falta de apoio de outros estados, São Paulo se encontrava num grande cerco militar.

Como as fronteiras do Estado foram fechadas, não havia como adquirir armamento para o conflito, fora do país, assim muitos voluntários levaram suas próprias armas pessoais e engenheiros da Escola Politécnica do Estado (hoje EPUSP) e do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) passaram a desenvolver armamentos a serem produzidos pelo próprio Estado para suprir as tropas.
No teste de um novo canhão, um acidente matou o Comandante da Força Pública, Coronel Júlio Marcondes Salgado. Uma das armas mais sofisticadas feitas pela indústria paulista foi o trem blindado, usado na campanha militar no Vale do Paraíba.

São Paulo criou moeda própria, que foi falsificada pela ditadura e distribuída na capital paulista para desestabilizar a economia do Estado. O dinheiro paulista era lastreado pelo ouro arrecadado pela campanha "Ouro para o bem de São Paulo", também chamado de "Ouro para a vitória".

Também foram compradas armas nos EUA, mas o navio que as transportava foi apreendido. Houve muita falta de munição, o que levou os paulistas a inventarem e usarem um aparelho que imitava o som das metralhadoras, chamado de "matraca".

Houve intensa mobilização através do rádio, uma novidade na época, onde se destacou César Ladeira da Rádio Record. Usou-se muita propaganda e contra-propaganda ideológica por parte da ditadura que acusava São Paulo de estar nas mãos do facismo italiano trazido pelos imigrantes. Eram recrutados, pela ditadura, brasileiros de outras regiões para combaterem São Paulo dizendo-lhes que São Paulo queria se separar do Brasil.

A ditadura colocava elementos infiltrados em reuniões e comícios em São Paulo que pregavam o derrotismo e o desânimo da população.

O crime mais bárbaro, ocorrido durante a Revolução de 1932, ocorreu na cidade de Cunha onde as tropas da ditadura torturaram e mataram o agricultor Paulo Virgínio, por este se recusar a dizer onde estavam as tropas paulistas. Paulo Virgínio foi obrigado a cavar sua própria sepultura e morreu dizendo: "Morro mas São Paulo Vence!"

Em meados de setembro, as condições de São Paulo eram precárias. O interior do Estado era invadido paulatinamente pelas tropas de Getúlio Vargas e a capital paulista era ameaçada de ocupação. A economia de São Paulo, asfixiada pelo bloqueio do porto de Santos, sobrevivia de contribuições em ouro feitas por seus cidadãos e as tropas paulistas desertavam em números cada vez maiores.

Vendo que a derrota e ocupação do Estado era questão de tempo, as tropas da Força Pública Paulista, atual Polícia Militar de São Paulo são as primeiras a se render, no final de setembro. Com o colapso da defesa paulista, a liderança revoltista se rende em 2 de outubro de 1932 na cidade de Cruzeiro para as forças chefiadas por Pedro Aurélio de Góis Monteiro. A maioria dos líderes paulistas, que não tinham sido exiladas em 1930, foram, com a derrota de Revolução de 1932, exilados.


16 Fatos sobre a Revolução Paulista
1 - As duas principais avenidas que ligam a cidade São Paulo de norte a sul - Nove de Julho e 23 de Maio, têm seus nomes vinculados a datas do movimento constitucionalista. No dia 23 de maio, foram mortos os jovens Martins, Miragaia, Drausio e Camargo (cujos sobrenomes formam a sigla MMDC).

2- O primeiro jogo de handebol oficial no país foi realizado no Clube Germânia - atual Clube Pinheiros. A partida foi organizada pela colônia alemã, com objetivo de recolher fundos para as vítimas dos combates, em agosto de 1932.

3- As transmissões mais importantes das rádios paulistas - Recorde e Cruzeiro do Sul - em 1932 foram feitas entre 2h e 4h da madrugada. Neste horário, as ondas alcançavam maior distância e permitiam que os adeptos do Movimento Constitucionalista em outros estados pudessem ouvi-las.

4- Todos os atletas paulistas que participaram das Olimpíadas de Los Angeles, em 1932, se alistaram para lutar na Força Constitucionalista ao retornarem ao Brasil. A exceção foi a jovem nadadora Maria Lenke, que tinha apenas 17 anos de idade. Ela foi a primeira mulher sul-americana a disputar uma Olimpíada.

5- A atual bandeira paulista foi usada pela primeira vez como símbolo do estado de São Paulo em 25 de janeiro de 1932, durante a primeira grande manifestação de rua paulista contra a ditadura de Getúlio Vargas. A bandeira havia sido criada para ser símbolo do país após a Proclamação da República, em 1989, mas acabou preterida. Ela começou a ser hasteada na área bancária do centro de São Paulo e também servia para identificar as sacas de café produzido no estado. A bandeira não tinha, porém, a mesma configuração. Como era feita em casa, o número de listras variava. São treze listras variando entre branco e preto. Durante o Estado Novo, Vargas proibiu o uso de símbolos pelos estados e a bandeira paulista chegou a ser queimada.

6 - Criada para arrecadar dinheiro para compra de armas nos Estados Unidos, a campanha "Ouro para o Bem de São Paulo" foi um sucesso. A aquisição de armas, porém, não foi viabilizada. Para usar o dinheiro e impedir que ele fosse confiscado pelo governo Vargas, ele foi doado para término da construção da Santa Casa. Mesmo assim, sobrou dinheiro. Ele foi usado para construir o prédio "Ouro para o Bem de São Paulo, Largo da Misericórdia. Sua fachada tem a forma da bandeira paulista, em alto e baixo relevo. A intenção era que o prédio, alugado, ajudasse a prover recursos para a Santa Casa.

7 - O mais jovem soldado morto em combate na Revolução de 32 tinha apenas 9 anos e meio de idade: o escoteiro Aldo Chioratto, foi morto durante bombardeio aéreo em Campinas.

8 - Santos Dumont estava na Praia das Pitangueiras, em Santos, quando viu um ataque de um avião paulista a um navio da Marinha que estava bloqueando o acesso ao Porto de Santos. O avião explodiu no ar e mergulhou em frente à praia. Santos Dumont, que já vivia um período depressivo, retornou à pensão, tirou a gravata e se enforcou.

9 - Todas as colônias estrangeiras estabelecidas em São Paulo colaboraram com o Movimento Constitucionalista, inclusive a japonesa. Soldados nisseis engrossaram as tropas paulistas. Entre as doações estavam um saco de arroz e um de banana doados por agricultores japoneses do oeste paulista.

10 - A viúva de Rui Barbosa, Maria Augusta Viana Bandeira, que morava no Rio de Janeiro, encaminhou a aliança de casamento para a campanha "Ouro para o bem de São Paulo". Ao ser criticada, ela afirmou que se o marido estivesse vivo, concordaria.

11- A marchinha "O teu cabelo não nega", de Lamartine Babo, foi o grande sucesso do carnaval de 1932. Nela, o compositor ironiza a nomeação de interventores: "Mulata, mulatinha, meu amor. Fui nomeado teu tenente interventor".

12 - As tropas combatentes das frentes paulista e mineira pararam para cantar juntas a música "A voz do violão", sucesso na voz de Francisco Alves. Um soldado paulista, único a ter um violão, iniciou alguns acordes. Do outro lado do 'front', outro soldado gritou: "Ô paulista, toca aquela do violão". E as duas tropas rivais soltaram a voz - afinal, eram todos brasileiros.

13 - Embora a revolução tenha acontecido em São Paulo, havia aliados por todo o país, entre eles Rio de Janeiro, Pará, Amazonas, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A cidade gaúcha de Soledade declarou publicamente seu apoio às tropas paulistas.

14 - Embora muitos quisessem olhar o Movimento Constitucionalista como uma disputa Rio-São Paulo, havia apoio às tropas paulistas no Rio de Janeiro e eram constantes as transmissões das rádios paulistas no estado. Havia constantes boatos de que haveria sublevação no Rio, levando a polícia política de Vargas tentar localizar os transmissores locais.

15 - A primeira mulher a se eleger deputada federal foi a médica paulista Carlota Pereira de Queirós, que liderou a União Cívica Feminina durante a revolução. Até então, mulher sequer votava. A mobilização das mulheres na Revolução de 1932 deu força ao movimento a favor do voto feminino. Carlota foi eleita em 1934.

16 - As informações desta lista foram passadas por um estudioso no assunto, o coronel da Polícia Militar Luiz Eduardo Pesce de Arruda, de 48 anos. Ele se encantou com o tema no primeiro ano da academia. Hoje, comanda o Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores da Polícia Militar em São Paulo. Arruda escreveu até mesmo um musical, chamado "1932 - Os sons da guerra".

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